Então, os roboticistas trocaram os problemas. Em vez de substituírem os humanos que entregavam as refeições, eles criaram um robô simples de telepresença que visitaria os pacientes e enviaria um link ao vivo para os entes queridos de cada um. O dispositivo era feito de peças prontas para uso, era barato, fácil de manter e não exigia que a equipe hospitalar já sobrecarregada gastasse tempo com ele. Os pacientes e parentes adoravam poder ver e ouvir uns aos outros.
Quer queira, quer não
Nem todo mundo está convencido de que uma nova era de robôs se inicia. Céticos sugerem que até mesmo robôs supostamente “autônomos” precisam de um supervisor humano para intervir quando a máquina é surpreendida pelo desafio de navegar por ruas, hospitais, depósitos ou residências. Por enquanto, a maior parte do trabalho criado pela covid-19 — no cuidado com pacientes, entregas, fiscalização de regras e outras áreas — ainda é realizada por pessoas.
Uma outra preocupação é a de que os robôs podem acabar sendo bons demais no que fazem — permitindo vigilância em massa e violação de privacidade, ou tornando fácil demais causar danos ao meio ambiente com a justificativa de responder à pandemia. No início deste ano, robôs voadores foram utilizados na China para aplicar grandes quantidades de desinfetante em locais públicos, relata Murphy. “Não sabemos qual foi o impacto ambiental”, conta por e-mail. “Não há dados sobre quais desinfetantes estão sendo usados, nem a que concentração e se escoaram em esgotos e canais de abastecimento de água”.
Recentemente, Murphy e seus colegas pesquisaram relatórios em redes sociais, jornais e periódicos acadêmicos sobre o uso de robôs relacionados à covid-19. Segundo a pesquisa, dos 262 relatórios analisados de março a julho, 45 focaram em questões éticas e 17 eram sobre ameaças de vigilância excessiva ou violações de privacidade.
Então, como sempre acontece quando se fala em robôs, as pessoas temem perder seus empregos. No primeiro semestre, conforme a pandemia se intensificou, os empregadores que adotaram robôs se preocuparam em proteger seus funcionários, não em substituí-los. Mas isso pode estar mudando, lamenta Murphy.
“Por volta de junho, começamos a perceber uma necessidade de maior automação, não para aumentar a capacidade de trabalho ou lidar com oscilações, mas para lidar com a perda de funcionários”, explica. Frigoríficos, depósitos de comércio on-line e outras instalações estão considerando os trabalhadores robôs como uma forma de manter os funcionários humanos distantes uns dos outros com segurança, acrescenta Murphy. “Talvez notemos um certo deslocamento de mão de obra ou perda de emprego como resultado. Não sabemos quais serão as consequências”.
Ainda assim, as pessoas parecem cada vez mais dispostas a permitir que os robôs façam o trabalho antes realizado por humanos no mundo todo, e há mais fabricantes de robôs do que nunca oferecendo produtos como resposta a essa demanda. A pandemia da covid-19 inaugurou um experimento global sobre como, onde e por que inserir robôs em nossa rotina.
“O cenário atual está propício para a robótica, embora não esteja bom para nós enquanto sociedade”, declarou Antonio Bicchi, professor de robótica da Universidade de Pisa, em um painel sobre robótica e covid-19 em maio, na edição anual (e, neste ano, virtual) da Conferência Internacional de Robótica e Automação. “Para a robótica, este é o momento de ajudar as pessoas. E estamos prontos para isso.”